A Praça Portugal está no centro das discussões sobre a ocupação de espaços públicos em Fortaleza. Desde a proposta de sua retirada, muitas discussões têm sido levantadas em torno do uso, da memória e da arborização das avenidas de Fortaleza. Apesar disso, a Prefeitura de Fortaleza busca dar viabilidade a um projeto de mudança do espaço.
Com futuro ameaçado devido às mudanças do Plano de Ações Imediatas em Transporte e Trânsito de Fortaleza (Paitt), onde o equipamento passaria por uma transformação, virando um cruzamento e quatro áreas de lazer, a Praça Portugal se encontra no coração do bairro Aldeota.
Além das mudanças na praça, o plano prevê a implantação de um binário nas avenidas Dom Luís e Santos Dumont, que até o fim do mês de maio tem previsão para conclusão (na publicação já deve estar pronto). Um dos principais pontos, para quem defende a alteração, é de que a praça não é ocupada pelos cidadãos e que a extinção dela ajudará o trânsito a fluir melhor. Por outro lado, quem é contra a demolição afirma que o espaço é ocupado, principalmente durante os fim de semana e que a praça representa um importante equipamento histórico, e turístico, da cidade.
Segundo Raimundo Lima Cardoso, de 54 anos, funcionário de uma banca de revista, não há movimentação na praça durante a semana, tanto no período diurno quanto noturno. “Só dia de sábado. Há dois anos aqui e nunca vi muita gente na praça na semana. Sábado tem mais e domingo um pouco. Mas na semana ninguém vem passear”, conta.
O fato pode ter uma explicação: há uma enorme dificuldade em atravessar a rua durante a semana. A reportagem cronometrou as quatro travessias em que teve oportunidade e demorou 5min10s na primeira, 9min20s na segunda, 6min14s na penúltima e 13min03s na última. Moradores da área reclamam da situação. “É muito difícil passar por ali. Toda vez que me aventuro ou demoro muito pra chegar na Praça ou quase sou atropelada. Gosto de lá, principalmente com meus netos, mas não adianta tentar”, comenta dona Lúcia dos Santos, de 67 anos.
Enquanto o impasse sobre a praça continua, comerciantes estão preocupados com o futuro dos empreendimentos. Para Pedro Mendonça, gerente de uma loja situada na avenida Dom Luís, a alteração pode custar caro para a empresa. “Não sei quanto tempo as obras iriam durar, mas afetaria, e muito, nos negócios. Sem falar que o sinal também não é interessante, porque acabar com algo tão bonito como a Praça Portugal não é a melhor saída”, fala o gestor.
Já para Raimundo Cardoso, não houve nenhuma conversa da Prefeitura com os comerciantes da região. “Não teve conversa com ninguém, em nenhum momento. Não sei como vai ficar. O trânsito pode até ficar bom, mas para nós vai ficar ruim, porque o movimento inteiro da rua vai acabar”, lamenta.
Acompanhando o comercial formal, os ambulantes que atuam no entorno da praça também lamentam a mudança. É o caso de dona Hosana de Brito Silva, de 68 anos, que vende comida há 38 anos no local. “Eu sou contra, porque vai acabar o ponto dos táxis e vai acabar o meu pontinho. Acho que nem o trânsito melhora”, fala.
A vendedora ambulante também lembra que a praça tem sua importância histórica. “Já teve o pessoal da feirinha da Beira-Mar que veio vender artesanato por aqui, lá para 1989”, relembra Hosana.
Com 67 anos de existência, o monumento foi construído na administração do prefeito José Walter, e chama a atenção de quem trafega pelas avenidas Desembargador Moreira e Dom Luís. O formato circular da praça comporta um cenário verde em meio a diversos prédios comerciais e shoppings importantes da cidade.
Em cada canto da praça, é possível encontrar uma banca de revista e um ponto de táxi. No início dos anos 2000 começou a ser um ponto de encontro de diversas tribos da cidade, representadas pelos jogadores de RPG, emos e otakus.
“É um ponto muito legal. Quando eu era adolescente ia sempre, e até hoje lembro com nostalgia dos bons momentos vividos por lá. Hoje é meu irmão quem vai pra lá e não vejo o porquê da demolição”, relembra o universitário João Freitas, de 24 anos.
Já para Patrícia Rebouças, a praça é local de encontro com os amigos. “Vou quase toda semana trocar figurinhas de álbuns que coleciono. Não sei porque querem mudar e dizem que não vem gente, se vem”, conta a estudante de 16 anos.
No auge da polêmica sobre o entorno da praça, o prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio concordou com a opinião de alguns comerciantes que atuam no local e chegou a dizer que a “Praça Portugal não é uma praça, mas uma rotatória”.
Ainda segundo Roberto Cláudio, a medida pode ser concluída mais rapidamente, com menos recurso financeiro e tem“menor impacto urbanístico que a construção de um túnel, como anunciado no fim de 2013. Além da alteração de sentido nas vias próximas da Praça Portugal, as mudanças na Aldeota prevêem ainda a readequação da iluminação pública, a requalificação de passeios, a inclusão de ciclofaixas e uma faixa preferencial de transporte público.
Até o fechamento desta reportagem, a situação da Praça Portugal estava pendente. Inaugurada em 1968, o equipamento está garantido por conta de uma liminar expedida pelo juiz Manoel de Jesus da Silva Rosa, da 8ª Vara Cível, com base na Lei Orgânica do Município , que diz que as praças públicas da cidade e seus respectivos equipamentos devem ser preservados em sua forma original e que qualquer alteração do projeto arquitetônico ou de denominação das praças será submetida à apreciação da Câmara Municipal.
Por outro lado, a Câmara aprovou o projeto que autoriza as modificações. Por 30 votos contra sete, a maioria dos vereadores aprovou a requalificação do equipamento. Por conta da liminar expedida pela 8ª Vara, as alterações ainda não podem ser executadas.